Muitas e várias horas depois da meia-noite, madrugada fora portanto, vi-o. Nessa sexta feira de manhã tinha voltado a acordar leve, fresca e fofa, depois da enxaqueca FDP que me tinha fodido lixado a cabeça a semana toda. Sentia-me tão feliz por já não ter dor, de me voltar a sentir eu própria, uma espécie de euforia antecipada, sabia lá eu na altura porquê. Já estaria a adivinhar o que aí vinha? Nessa tarde fui para a Ericeira, para o encontro anual da empresa. Estão a ver quando, na escola, deveríamos dizer "visita de estudo" e saía-nos sempre a expressão "excursão" e na verdade aquilo era mas é uma grande rambóia? Pois, foi isso, versão corporate. Que incluiu bar aberto e toda a rebaldaria que daí vem. A música, as brincadeiras, os brindes a quem é cá da malta, os prémios, alguns deles em forma de garrafas sei lá eu de quê, a euforia de ter um fim de semana "work hard, play harder" e de repente, o mundo parou. Eu não olhei para o relógio, mas caraças, o mundo parou ali, por um instante. Encontrei os olhos dele no meio da multidão. Depois, o sorriso, aquele sorriso. Uma constante e descarada troca de olhares, in vino veritas e já não havia condições para disfarçar. Quando me apercebi, os meus pés estavam a caminhar em direcção a ele. Chama-se João e de repente eu já não sei nada, só sei que quero mais, muito mais, daquilo que estou a sentir. Ali ele apanhou-me. A caminho do quarto, no fim da noite, um outro gajo que colaborava com a empresa tentou beijar-me, que o engate tinha ficado a marinar desde a última festa reunião de empresa, mas assim que ele se chegou perto de mim eu quis ser fiel ao que estava a sentir e mandei o pobre coitado às couves. Sim, quis ser fiel a alguém com quem havia trocado duas palavras e não me lembro já quais. Lembro-me sim de pensar que não ia beijar um homem estando a pensar em outro. Lembro-me de pensar que aqueles olhos e aquele sorriso me raptaram os pensamentos e quis ficar livre para ele. Também me lembro na manhã seguinte, na sala de formação, de pensar que idiota que tinha sido, porque ele vivia longe de mim e portanto não havia futuro ali. E também porque apenas e só tínhamos trocado olhares e algumas palavras. Arrumei, portanto, o assunto na minha cabeça. Até que a formadora nos pede para nos juntarmos em grupos para uma actividade. Ele levanta-se e vem direito à minha mesa. E eu perco a pouca concentração que tinha. Não o voltei a ver nesse fim de semana. Voltei para casa no domingo a desejar loucamente a santíssima "trindade" de cinco elementos de sofá, aquecedor, manta, pizza e anatomia de grey. Ligo o pc para ver as fotos que tooooodos os colegas publicam no fb da festa e lá está o pedido de amizade dele. Nunca mais parámos de falar e hoje ele é o meu marido.